26.11.22

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Há muita coisa que eu não consigo perceber - e algumas delas, dou graças aos céus por isso assim acontecer. Uma delas é a quantidade assombrosa de gente que se dedica nos dias de hoje a passar ondas positivas e a andarem, armados em Budas, a dar conselhos iluminados sobre como nós devemos andar abraçados uns aos outros, a transmitir energias positivas e a viver em harmonia com o Universo. Aqui na zona, temos um ashram que arrasta multidões, de tal forma que, segundo os últimos Censos, a nossa freguesia foi uma das poucas do concelho (e a única do interior!) a registar um aumento de população residente. Nada contra este movimento, atenção: se os locais vão falecendo e os descendentes cortaram os laços, qualquer grupo de pessoas que venha habitar este território é sempre bem-vindo. Especialmente quando os recém-chegados colocam os seus filhos nas escolas da região, fazem compras no comércio local, dão trabalho às formas de construção civil da zona. E fazem da feira mensal de velharias e produtos locais um sucesso desde a primeira edição, 

Todavia, há questões que não deixam de me surgir associadas ao ashram e aos seus seguidores.

1) o ashram é focado num líder, claro, e num líder carismático que arrasta multidões (basta ver a quantidade de gente que veio atrás dele), que professa ensinamentos derivados do budismo. Até aqui, nada de anormal. A primeira coisa que causa alguma estranheza são as regras para se poder visitar o ashram: nada de fotografias ou vídeos e os trabalhadores estão proibidos de falar sobre o que se passa lá dentro, de tal forma que mesmo as reportagens feitas por órgãos da comunicação social sobre o espaço são impedidas de registar imagens: se tudo o que se lá passa é tão positivo e bom, porque é proibido fotografar ou filmar o que quer que seja?

2) como disse, há centenas de pessoas a viver cá na freguesia graças a este ashram, pessoas que orbitam em redor dele e bebem todas as palavrinhas que o guru debita, frequentando as suas palestras e os seus retiros - e pagando por isso. Agora… essas pessoas vivem do quê? Algumas trabalham no restaurante entretanto aberto na sede de freguesia (e devo desde já dizer que a comida é de topo), mas não são muitas, portanto… de onde lhes vem o dinheiro para pagarem os retiros e as coisas do dia-a-dia? Certo, haverá os que trabalharão em regime de tele-trabalho, ainda antes da pandemia… mas todos? É que não se dá conta de muitos deles fazerem grande coisa - ou talvez eu esteja a olhar para o lado errado, também pode ser, admito. Muita desta malta vai-se dedicando a fazer produtos esotéricos, chás de toda a variedade, comidas veganas, vegetarianas e "normais", para quando se realizar o mercado de velharias e produtos locais venderem as suas obras uns aos outros… mas mais uma vez pergunto: todos?

Gostava de perceber todo este movimento hippie em busca da sustentabilidade ecológica e espiritual, do andarem descalços em todo o lado até mesmo no alcatrão da estrada, da necessidade de fazerem sabonetes de folhas de cânhamo e de pétalas de lírios colhidos numa noite de luar, do terem rebanhos de cavalos em que alguns até têm as costelas à mostra… Sim, parece que me desviei um bocado do objectivo inicial do post. Porém os novos habitantes do Alentejo profundo acabam por possuir estas características, vindos atrás das teorias de gurus ou de estilos de vida diferentes, desencantados com o capitalismo desenfreado e atirando-se de cabeça à primeira ideologia inclusiva que apareça. Não percebo, pronto.

 

PS: provavelmente dos textos mais parvos e sem nexo que escrevi - o que, num sítio onde temos "disfunções mentais", é obra. E ainda queria escrever um livro, eu…!

disfunção original de Carlos Loução às 23:12

30.10.22

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Há textos em que, assim que os começo, aparece uma vozinha lá no fundo da minha cabeça a gritar, alto e bom som: "NÃO ESCREVAS SOBRE ISSO! ISSO VAI DAR MERDA!" Só que, como o senso comum nunca foi muito o meu forte, eu lá os acabo e publico aqui neste espaço. Por acaso, o primeiro em que aconteceu isso não gerou a celeuma que eu receava (basicamente porque ninguém lê esta merda); todavia, como agora vou dar uma bordoada bem forte num autêntico ninho de vespas, não me devo safar. Bem, olhem, amiguinhos, tive muito gosto, etc e tal.
A nossa sociedade tem-se vindo a alterar ao longo dos anos, fruto da evolução própria das coisas, mas tem sido uma evolução que tem dado errado em diversos patamares. E num deles é a dita questão do ambiente. E começo com uma admissão: sim, o meio ambiente está doente, fruto de centenas de anos de atropelos ambientais com efeitos já a médio e longo prazo que podem colocar em causa a habitabilidade deste terceiro calhau a contar do Sol (e logo agora que descobrimos que conseguimos desviar meteoros perigosos sem ser preciso mandar dois vaivéns cheios de homens e máquinas de perfuração, nem chamar os Aerosmith para fazerem a música de acompanhamento da missão!). Tem-se feito muito mal a este planeta sem se pensar no dia de amanhã nem no planeta que vamos deixar aos nossos descendentes. Até aí, tudo certo.
O problema começa quando começamos a ver a espécie de jihad iniciada por grupos organizados de pessoas contra alvos pré-determinados. Atirar sopa contra obras de arte envergando t-shirts "Just Stop Oil" (Parem com o Óleo, numa tradução rasca)? Colarem-se a carros? Se a ideia é aparecerem nos noticiários de todo o mundo (e em constituírem material para programas humorísticos), parabéns, a manobra é um sucesso, mas em termos de efeitos práticos isso faz zero pelo ambiente. Alertar para os problemas que existem no mundo? Acho que os noticiários já se encarregam disso ("mas esses são controlados pela máquina capitalista e consumista que governa o mundo!", até parece que vos oiço dizer…). Mas não vejo utilidade em servir de "pega-monstros" no Museu do Louvre. A não ser que o objectivo seja mostrar "olhem para mim, preocupo-me tanto com o ambiente que até me colei à Mona Lisa com uma t-shirt da minha organização ambientalista!"
Neste município em que habito e trabalho, é fácil ganhar-se créditos no eco-fundamentalismo: basta dizer-se que se é contra as estufas e contra os eucaliptos. Atenção: não estou com isto a dizer que sou a favor da existência de estufas e de explorações agrícolas em pleno Parque Natural do Sudoeste Alentejano e da Costa Vicentina; lembro-me de uma reportagem sobre o caso, há meses, talvez na SIC, em que apareceu um responsável do PNSACV a falar e que até dava vergonha alheia só de ouvir, coisinha mais subserviente às empresas não conseguiriam arranjar. Diz-se que a exploração intensiva dos territórios está a matar o sudoeste alentejano, e eu acredito nisso – aliás, fiquei surpreso quando vim a saber que iam ser colocadas ainda mais estufas na zona do Brejão, se não me engano – e que as empresas são responsáveis por imensos crimes lesa-ambiente e contra os direitos humanos, com imigrantes ilegais a serem traficados de Bangladesh, Índia, Nepal, Paquistão e zonas limítrofes para trabalharem nas estufas por cascas de alho. Esse tem sido o segredo mais mal-guardado desde que se descobriu que o Putin era um homicida tresloucado ("Então se vês problema nisso tudo, qual é o teu problema?", perguntarão os críticos). O problema é que enchem-se posts no Facebook cheios de indignação com tudo o que se passa ao redor das estufas, fazem-se manifestações e quejandos… e vê-se poucos ou nenhuns resultados práticos, pois a laboração continua, os migrantes continuam a trabalhar nas estufas, e, de um modo geral, nada muda. Eu juro que, num Universo alternativo, gostava que os mais veementes protestantes contra o actual status quo no PNSACV pudessem ser mandantes e ditar as leis no município sobre o que ao meio ambiente diz respeito. Tenho um palpite que as coisas não se alterariam mormente – mas lá está, não passa de um palpite, pelo que nunca virei a saber se estou certo ou não.
Sobre os eucaliptos, a questão tem sido mais pacata, mas ainda gera celeuma por se plantarem e ainda existirem vastas centenas de hectares de eucaliptal nesta serra, uma vez que o eucalipto causa a seca dos terrenos e é uma árvore sinónima do capitalismo, secando tudo ao seu redor. Nesta questão, lamento imenso mas não consigo ser contra a sua existência no Alentejo. É que o ser-se contra o eucalipto é, acima de tudo, uma questão ideológica: basta dizer "não ao eucalipto!" para sermos considerados pessoas de bem e preocupadas com o ambiente… e ninguém se preocupa na economia da região que depende da existência de florestas de eucalipto, dos operadores de serras que os cortam quando já têm tamanho suficiente, dos operadores das máquinas que os carregam para os camiões, dos condutores de camiões que levam os troncos para as fábricas, dos vendedores e mecânicos de serras que as arranjam quando elas avariam… e dos donos dos terrenos que sempre recebem alguma coisa por venderem os eucaliptos à empresa (os terrenos que não são pertença da empresa, atente-se). Porque qual é a alternativa a ter-se um terreno com eucalipto? Fazer-se um projecto de sobreiros ou de medronheiros, porventura, pois são árvores autóctones. Mas demora tempo até se obter retorno desse investimento (se sobreviver à seca que cada vez mais vai invadindo este Sul), e é preciso limpar-se os terrenos todos os anos (ou a cada dois anos) para que o mato não invada o terreno; depois os donos dos terrenos morrem e os filhos não querem saber daquilo para nada pois vivem na cidade, deixam as propriedades entregues ao mato selvagem ("ao menos é autóctone", direis) e é um piscar de olhos até os terrenos terem mato maior que a altura de um homem e trazerem até à beira dos poucos terrenos habitados bichos selvagens que estragam as culturas… Talvez esteja ver as coisas por um prisma errado: ao contrário de muita gente, não digo que sou o dono da razão, nem tento evangelizar ninguém, apenas debito para aqui ideias minhas (e más, daí isto ser "Disfunções Mentais"); mas gostava de saber quais são as ideias que a malta da brigada ecológica tem para todos os trabalhadores que retiram o seu sustento das florestas de eucalipto. Mandam-se para a rua? Detona-se a economia de uma região onde há pouco emprego em nome da ideologia bacoca que apregoa aos sete ventos que “o eucalipto é mau e deve ser banido para todo o sempre”?
O meu medo é que, derivado da inocuidade de muitos dos protestos que têm sido feitos, se queira passar para o nível seguinte e se comece a orquestrar e levar a cabo atentados em nome do ambiente. Talvez seja uma loucura, admito, mas vejo fanatismo suficiente em alguma gente para imaginar que não haverá problemas em se colocar uma bomba numa refinaria de petróleo, por exemplo, ou numas estufas, para se marcar uma posição bem mais ruidosa sobre o ambiente e causar danos em quem causa danos no meio ambiente.
Voltando à questão dos protestos, é mesmo aí que toda a hipocrisia fica exposta: vemos milhares de miúdos em todo o mundo a carregar cartazes (de papel ou cartolina, mas também umas tabuletas de madeira), a desfilarem rua fora registando o momento nos seus telemóveis topo de gama (feitos em fábricas situadas em países onde a mão-de-obra custa umas cascas de alho, com baterias de lítio, o mesmo lítio que supostamente é tão mau que nem sequer se pode extrair em Portugal porque dá cabo do ambiente, anulando os possíveis postos de trabalho que pudessem vir a ser criados) e partilhando nas redes sociais. O que acontece depois do desfile? Claro, todos os cartazes vão entulhando os contentores do lixo ou ficam abandonados no meio da rua, o que derrota um bocado (“bocadinho”) o propósito de se fazer uma marcha pelo meio ambiente… mas talvez seja eu a ser tacanho.
Admito que às vezes eu próprio faço um protesto ecológico: quando paro o carro à beira da estrada para aquele aliviozinho da bexiga e tenho tempo, paro um bocado para recolher o lixo que se encontra nas redondezas, garrafas de vidro e plástico essencialmente mas não só, e levo-o para o ecoponto mais próximo. É um protesto silencioso e sobre o qual coloco exactamente zero fotografias nas redes sociais – assim falhando o objectivo de parecer que me importo com o meio ambiente. Mas ao menos fico no meu mundinho a achar que tive relevância para ajudar a reduzir um nadinha a minha pegada ecológica. Nós, os malucos, contentamo-nos com pouco.

disfunção original de Carlos Loução às 12:28

01.07.22

Foto: Luís Guerreiro / CMO

Não há como fugir: sempre que se fala de "cantares de improviso", a primeira coisa que as pessoas vão logo buscar é a desgarrada minhota, acompanhada à concertina ou ao acordeão, onde dois cantadores (ou duas cantadoras, ou um casal) ou mais, trocam entre si argumentos, que normalmente, e para gáudio da audiência, acabam sempre por ser questões ligadas com a braguilha. Todavia, Portugal não é apenas e só o Minho, da mesma forma que o fado não é exclusivo de Lisboa: há diversos sítios, de Norte ao Sul do país, passando pelas ilhas, onde se canta de improviso, se desafia o(s) parceiro(s) com cantigas feitas no momento. E, sendo eu alentejano (mesmo que não de nascimento, de família, de moradia, o que quiserem), claro que tenho de me preocupar com as duas formas de cantares ao desafio que aqui temos no Sul do país: o baldão e o despique.

sete anos, prometi que teria de fazer um post sobre esta temática, e desde então o assunto tem ficado na jarra. Engraçado que tenho desde essa altura nos "Rascunhos" desta xafarica um post sobre os cantes de improviso, a explicar como são e como funcionam. Um dia, talvez pegue nele e o acabe, pois talvez esse seja mais importante do que este que estou a fazer, onde basicamente vou confessar o meu desânimo pelo estado dos cantares ao improviso alentejanos.

Em 2014, o Cante Alentejano foi considerado Património Imaterial da Humanidade pela UNESCO, o que motivou um fluxo de gente a procurar abraçar o cante, a divulgar o cante, a fazer o cante (e a esfaquear o cante de alto a baixo, mas isso são contas de outro rosário). Essa candidatura, claro está, não considerou o parente pobre do cante, ou seja os cantares de improviso - despique e baldão - que, basicamente, foram deixados à sua mercê para se desenrascarem como pudessem para sobreviver. A viola campaniça, por exemplo, e mercê do trabalho incomparável do meu amigo e colega de diversas tardes e noites de folia Pedro Mestre, está mais que salva, pelo menos por mais esta geração. O cante ao baldão e ao despique, ao invés, está em risco de desaparecer em meia-dúzia de anos, se nada fôr feito.

E o que tem sido feito? Algumas coisas. Por duas vezes os cantes de improviso alentejanos foram à rúbrica "Cantares ao Desafio" da "Praça da Alegria" da RTP, tendo da segunda vez alcançado um mui honroso segundo lugar na final. E o "Cante ao Baldão acompanhado à Viola Campaniça" também figurou no concurso das "7 Maravilhas da Cultura Popular", tendo ficado em 2º lugar na final regional e figurando no programa de repescagem. Pode parecer pouco, é certo, mas foram formas de mostrar ao país (e ao mundo lusófono, já agora) que existe esta forma de cantar, que está em risco de desaparecer e que urge fazer algo urgente por ela. Para além disso, o Centro de Valorização da Viola Campaniça e do Cante de Improviso, sediado em São Martinho das Amoreiras (concelho de Odemira), tem organizado, com regularidade mensal, Oficinas de Cante de Improviso onde cantadores veteranos procuram passar o seu saber a curiosos e interessados por esta forma tão característica de cantar.

Mas depois veio a pandemia. E tudo parou. Foi necessário procurar adaptar esta tentativa de entusiasmar pessoas para abraçar as novas tecnologias, daí ter-se feito vídeos de sensivelmente dez minutos em que dois cantadores esgrimem argumentos entre si, acompanhados à voiola campaniça, num modelo um pouco semelhante ao feito na "Praça da Alegria", com tema sorteado na altura.

E agora chegamos ao estado actual. Que é tudo menos sorridente. Temos, nesta altura, provavelmente, duas dezenas de cantadores ao baldão e ao despique. Só que, dessas duas dezenas, aproveita-se uma mão. E porquê? Porque a) não são capazes de discutir um assunto; b) não são capazes de respeitar o tom da viola campaniça que é suposto orientá-los; c) deixam que questões mesquinhas transtornem a sua forma de pensar e procurem desviar possíveis novos cantadores ("não cantes com aquele gajo, ele é um maniento de primeira e tem a mania que sabe tudo!"); d) apesar de terem uma voz perfeita para o cante, só aparecem quando muito bem lhes apetece e depois de lhes pedirem muito por favor e de joelhos que apareçam; e) só se sentem à vontade para cantar quando estão bêbados - altura em que nada do que dizem faz sentido; f) acreditam que o cante ao baldão deve ser uma mesa cheia de cantadores, e que fora disso não vale a pena meterem-se na roda; g) estão já velhos demais para essas andanças ou com problemas de saúde; e h) algumas ou todas as anteriores. O motivo f), inevitavelmente, acontece em cada festa anunciada nos concelhos de Odemira e Castro Verde - em específico nas Festas de Maio de Amoreiras-Gare e na Feira de Castro Verde - e acaba por resultar em algo que apenas pode ser considerado uma fraca propaganda ao cante de improviso: uma mesa com vinte ou trinta cantadores, em que um canta uma cantiga e só volta a cantar dali a perto de uma meia-hora. Qual é o cantor digno desse nome que consegue ter vontade de cantar nestes preparos? Quando o que é interessante é arranjar-se um tema, discutir-se uma temática, atacar o parceiro do lado por defender a dama errada enquanto apresenta argumentos que sustentam a sua posição... e, quer queiram quer não, esse tipo de cantes, os cantes que motivam, os cantes que têm interesse para o público que assiste, nunca podem ter mais de uma mão-cheia de cantadores; o ideal até seria mesmo cantarem dois a dois, o chamado "cantar de mão a mão", que a velha guarda designa depreciativamente como o "cantar dos manientos". Não há maneira de os promotores destes cantes (do qual a Feira de Castro Verde é o expoente máximo) se aperceberem que ter um cante com muitos cantadores não significa, de todo, ter um bom cante, muito pelo contrário. Basta ver, e continuando no exemplo da Feira de Castro, que, quando o cante começa o Auditório Municipal costuma estar cheio e, quando este termina, conta-se pelos dedos de uma mão a quantidade de gente que ainda lá está a assistir. Todos os anos isto acontece e, todos os anos, ninguém leva as mãos à cabeça e percebe que, se calhar, isto é sinal de que alguma coisa está errada. Se queremos que os jovens ganhem algum entusiasmo pelo cante ao baldão e ao despique, temos de lhes mostrar um cante ao baldão e ao despique mais interessante, mais arrojado, em que os cantadores se mordem uns nos outros, despicam entre si, motivam a audiência a manter-se agarrada às palavras que cada um canta. Uma mesa comprida com mais de vinte pessoas ali sentadas, uma a agradecer o convite que lhe foi dirigido, outro a saudar os presentes, outro a agradecer a qualidade da comida... não é promover o cante de improviso: é matá-lo! E o mais triste é ver uma grande fatia dos cantadores ao baldão a quererem seguir o caminho do Titanic, em vez de procurarem salvar esta tradição e impedir que desapareça - porque a única maneira de o salvar é cativar jovens, colocá-los no trilho certo, apoiá-los, trazê-los para a roda do cante, ensiná-los a estrutura das cantigas e a melodia. O Centro irá voltar a ter Oficinas de Cante de Improviso e aí procuraremos recuperar o tempo perdido com estes dois anos de pandemia, agora que já temos dois jovens capazes de fazer cantigas e de se meterem na roda e pelo menos mais três com interesse de se jogarem.

Há que salvar o cante ao baldão e ao despique da extinção. E dos velhos do Restelo, que só o afundam ainda mais.

disfunção original de Carlos Loução às 17:26

15.03.17

tumbleweed dry.jpg

Sim, mais um post sobre a desertificação.  E então?
Muita gente que habita nas imediações de Lisboa (qualquer grande cidade, na realidade, mas apetece-me implicar com os lisboetas, e agora?) entraria em pânico se precisasse de ir a um supermercado e este se situasse a uns 30 km de distância. Ou se tivesse um problema de saúde súbito que fosse necessário ir às urgências do hospital e estas estivessem localizadas a uns 70 km. E, todavia, existe muito boa gente que vive nessa realidade, em diversas zonas afastadas dos grandes centros de decisão; uma dessas zonas é aqui em que neste momento me encontro, nos confins do concelho de Odemira. Talvez esta fosse a zona a que o ex-ministro Mário "Jamé" Lino aludia quando se referiu ao "deserto". Sim, já sabemos que o interior está despovoado e ao abandono, que as vias de comunicação são de "passagem por" e não de "paragem em", que não há investimento suficiente para fazer as pessoas fixarem-se a estes meios pequenos. Então qual a solução? Deixar-se morrer quem ainda aqui vive e termos "aldeias-fantasma" à laia de atrações turísticas como hoje já temos as ruínas romanas, árabes e pré-históricas? Deixar que tudo isto se transforme num deserto como o do Sahara?
Só que ao mesmo tempo vem o reverso da medalha: como é que se convence alguém a investir nos meios rurais? Qual é a empresa que vai arriscar estabelecer-se num meio com pouca gente sabendo que todos os meios que necessita (matéria-prima, mão-de-obra) se encontram em quantidade insuficiente nas imediações? Só com grandes incentivos do Estado é que pode haver alguém a pensar nisso, o que não é solução, pois os cofres estatais não servem propriamente (ou não deviam servir) para esse tipo de coisas.
Então qual a solução? Pois, essa é que é a pergunta dos 50 mil euros. Mas "deixar morrer" é a solução que mais me revolta...

disfunção original de Carlos Loução às 10:35

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